terça-feira, 17 de junho de 2008

A fé, como a esperança não é a previsão do futuro é a visão do presente num estado de gravidez permanente.

Gladis Maia

Ter esperança significa estar pronto a todo momento para aquilo que ainda não nasceu e todavia não se desesperar se não ocorrer nascimento algum durante nossa existência. Não faz sentido esperar pelo que já existe ou pelo que não pode ser.

Erich Fromm, in A Revolução da Esperança.

Viver plenamente é agir em favor de um desejo de recuperação da dignidade, da integridade e da auto-realização em favor de sua própria vida e em prol da dos seus semelhantes. É estabelecer ou restabelecer esses direitos inalienáveis do homem! Viver plenamente é trabalhar com o conhecimento como um meio de libertar a humanidade do poder destrutivo do medo de sonhar com a reabilitação da vontade, da fé e da confiança no ser humano. Viver plenamente é ter como meta não o nosso extermínio através da guerra nuclear ou das catástrofes naturais, mas tratar o desenvolvimento tecnológico com uma reengenharia, que objetive novas descobertas tecnológicas e aproveitamento dos projetos já desenvolvidos somente - e sempre - a serviço do bem estar do homem.
Chamemos de feitiço contra o feiticeiro, criação contra o criador, maldição humana, ou outra expressão alhures, o certo é que, enquanto o homem - no auge da sua vitória sobre a natureza - tem concentrado sua existência na produção x consumo, sucessivamente, destruindo-se, tem-se portado como cego e surdo, insensível aos apelos da mãe natureza, que começa a mostrar sua força, com terremotos, vulcões, maremotos, temperaturas extremas,enchentes, temporais ...E,como se não bastassem: a fúria da natureza, as formidáveis guerras, agora ainda, cumprindo rituais sacros ou profanos, como shows e partidas de futebol, perecemos ante acotovelamentos e pisoteamentos de nossos irmãos de fé e de lazer ... Até aonde será que vamos, nesse ritmo?
A solução para este impasse passa necessariamente, acredito, pela ressurreição da esperança, tão bem cantada por Erich Fromm, no livro citado na epígrafe deste artigo. Não daquela esperança recheada de desejos e anseios, que não é esperança, mas cobiça de mais consumo. Não daquela esperança passiva, tipo salvação, em termos teológicos, ou revolução, em termos políticos, que nada mais são do que resignação e ideologias.Nas suas palavras: a esperança é paradoxal, não é nem uma esfera passiva, nem uma força irreal de circunstâncias que não podem ocorrer.
Muitos são os que se sentem conscientemente esperançosos, mas inconscientemente desesperados e vice-versa. Isso pode ser visto muito menos por suas declarações, do que por suas expressões faciais, maneira de andar e capacidade de reagir com interesse para algo diante dos seus olhos. Como acontece com todas as experiências humanas as palavras não são suficientes, para descrevê-la.
A esperança é um acompanhamento psíquico da vida e do crescimento humano. Quando ela desaparece a vida termina, de fato ou potencialmente. Ela está intimamente ligada à fé. A fé – palavra que vem do hebraico e significa certeza – não é, como pensam alguns,uma forma de crença ou conhecimento: fé nisto ou naquilo, mas a convicção sobre o que não foi ainda provado, o conhecimento da possibilidade real, a consciência da gravidez, na metáfora de Fromm. É certeza sobre a realidade da possibilidade, mas não é certeza no sentido da previsão indiscutível. Como os bebês, ela pode ser natimorta, pode morrer após o parto ou nas primeiras semanas de vida ... E a fé, é baseada na experiência da auto-transformação e se eu posso mudar, se eu me permito, os outros também podem.
A esperança acompanha a fé que não poderia ser sustentada sem o combustível da esperança. A esperança não pode basear-se senão na fé! Só vivemos plenamente quando aliada à esperança e à fé possuímos coragem, no sentido de firmeza. Firmeza como capacidade de resistência para não transformarmos nossa fé ou esperança em otimismo barato ou fé irracional. Firmeza enquanto destemor, como capacidade de dizer não, quando todos ao nosso redor querem ouvir e dizem sim.
A pessoa destemida não teme ameaças, e nem mesmo a morte! Não estamos nos referindo àqueles que não temem a morte porque não se importam com sua vida, porque viver para eles não significa muito... Referimo-nos ao destemor encontrado na pessoa plenamente desenvolvida, que se apóia em si mesma e à vida. Pessoa que superou a cobiça; livre, porque não se prende a nenhum líder ou ídolo - pessoa ou instituição; rica porque, ao esvaziar-se tornou-se oca, pronta para receber; forte, porque não é escrava de ninguém, nem mesmo de seus desejos.
Quando nos constituímos em ovo trazemos nos gens a esperança, a fé e a firmeza, mas quando a vida começa cá fora, as vicissitudes do ambiente começam a incrementar ou bloquear o potencial da esperança. Quando nascemos, não conhecíamos a invenção humana da mentira, com palavras, gestos e expressões. Logo aprendemos a dura lição, com nossos pais, nossos professores e líderes, em quem mais confiávamos: a maioria das vezes as palavras deles dizem exatamente o oposto do que querem dizer... E, infelizmente, há vezes em que a esperança é tão completamente destruída que um homem jamais poderá recuperá-la. É quando surge o endurecimento do coração.Entre os carentes, na total acepção da palavra, não é basicamente a frustração econômica que conduz ao ódio e à violência, mas o desespero da situação, das sempre repetidas promessas não cumpridas, isso sim ... Não é apenas o indivíduo que vive pela esperança! Classes, comunidades, nações, também! E, se perdem esse potencial, desaparecem, ou pela baixa vitalidade ou pela destrutibilidade irracional que desenvolvem, razão pela qual os maus políticos temem tanto as greves das classes organizadas em torno da esperança... Pensem nisto neste ano eleitoral...

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