segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Nada afasta mais as pessoas da agradável e cobiçada sensação de liberdade do que nutrir-se de idéias falsas



Gladis Maia


O homem real é um mamífero e tem várias reações que, "desgraçadamente", indicam seu parentesco com os outros animais; é imperfeito, insignificante e busca apenas os prazeres. E quanto mais estivermos seduzidos pelas belas idéias, mais difícil será aceitar e digerir a liberdade.
Flávio Gikovate, in A sociedade pode mesmo limitar nossa

Precisamos, todos, rever urgentemente nossa forma de encararmos os “nãos” que a vida nos apresenta, quase que diariamente. Alguns de nós mais do que os outros! O império do vale tudo pode acabar muito mal! A civilização está ameaçada! Procure lembrar-se - ou pesquisar sobre o assunto, se for muito novo - para ver se as coisas não eram mais leves, mais pacíficas...

Se antes uma frustração amorosa rendia lindos poemas, cartas perfumadas e serenatas, na tentativa de reconciliação ou conquista, hoje a história é mais prática, patética e trágica: noivo mata noiva que o traiu; namorado mata namorada que não quer seguir com a relação; filha mata pais que não aceitam seu namoro; filho mata pai para ficar com sua fortuna; pai mata filho que não o obedece; mãe mata filha que incomodava muito; neto mata avó para pegar dinheiro para a droga, avó mata neto que fazia muito barulho... Triste retrato da raça humana!

Temos que aprender, de qualquer forma - e urgentemente - a viver com nossas frustrações! Certamente quem age assim resolvendo seus problemas, ameaçando ou ceifando vidas, não recebeu na infância ensinamentos que lhe permitissem compreender e aprender nenhuma noção de limite, nem que fosse para burlá-los... Não aprendeu até aonde vai a sua liberdade. Não aprendeu que nossos pais e professores representam a lei - judicial, moral, ética, espiritual - com a qual vamos fatalmente nos deparar pelo resto de nossas vidas. Não aprendeu a gostar de si, muito menos dos outros. Não tem idéia do que seja o respeito próprio e ao próximo, muito menos o amor.

Provavelmente a história venha a registrar o movimento hippie como o movimento de jovens mais conseqüente dos últimos tempos. Ele surgiu na década de 60, uma geração de pessoas que se insurgiu contra o modo como via encaminhar-se a sociedade ocidental: novas guerras por causas muito duvidosas e agravamento da busca desenfreada de bens de consumo, ativando a competição entre os homens e os distanciando uns dos outros. Paz e Amor! Faça amor, não faça a guerra era o seu norte!

Mesmo não tendo sido um movimento muito bem organizado, não podemos esquecer ou desprezar as bases pessoais para tal postura - desejo de fugir da guerra, fascínio pela liberação sexual incipiente, etc. - assim como não podemos negar sua legitimidade como uma atitude crítica à ordem social estabelecida que se instalou e teve muitos seguidores em todo o mundo ocidental.

Aqueles jovens se caracterizaram por uma recusa à participação na vida econômica, social e mesmo cultural de suas sociedades, se posicionando, de modo passivo, em oposição ao meio. Cruzaram os braços, passaram a uma vida mais contemplativa, se dedicaram ao cultivo de uma aparência exterior que os distinguia da sua classe social originária e, em muitos aspectos, se aproximaram do modo de ser dos mendigos.
Seus seguidores vagaram pelo mundo como andarilhos, buscando principalmente o Oriente, tanto por causa da postura mais contemplativa que trataram de compreender melhor, como por causa das facilidades de acesso a certas drogas - maconha, em particular - às quais recorriam com freqüência.

Talvez para suportarem melhor a desocupação (coisa muito difícil para as pessoas de maior inteligência). Enfim, fizeram tudo de modo bastante antagônico ao que deles se esperava e estiveram sujeitos a muito poucas represálias externas.

Definitivamente eles não viveram de modo solitário. Pelo contrário, tentaram várias formas de vida em comunidade, experiências válidas apesar de malsucedidas a médio prazo. Os rapazes não ficaram sem companheiras e parceiras sexuais. Muitas foram as moças - das mais belas e inteligentes - que se encantaram com eles e lhes devotaram amor e amizade. Suas famílias os censuravam, mas ao mesmo tempo tinham uma ponta de admiração - facilmente convertida em inveja. O fenômeno se extinguiu mais por razões internas – leia-se, contemplação ou desocupação e uso exagerado de drogas - do que por causa das pressões exteriores.

Falei dos hippies para não dizer que não falei de flores... As idéias podem ser belas, pois no seu mundo existe a perfeição, o homem pode sentir-se importante, indispensável e pode - e deve - buscar a transcendência... Mas há que se ter muito cuidado, por que se as idéias ganham autonomia e se desvinculam do real elas podem ser muito lindas, mas são falsas! As idéias que não têm nada a ver com a realidade da nossa condição nos afastam da liberdade e é nesta categoria que estão muitos sistemas filosóficos e religiosos de grande aceitação, não somente entre jovens cabeludos, sujos e drogados - como muitos viam os hippies.

Quem assim se refere a eles, sem verificar o legado que nos deixaram, na seara da revolução sexual, da valorização da espiritualidade e da liberdade - não prestou atenção. Liberdade não é apenas uma velha calça rasgada e desbotada é um estado de espírito, uma alegria íntima - como um prazer erótico ou a forma mais consistente e genuína de vaidade - que deriva da coerência entre pensamento e conduta!Sejamos livres!

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