segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Não importa o que façamos a uma criança, desde que todas as nossas atitudes para com ela sejam corretas



Gladis Maia

Quando estou meio decepcionada por não ver meus sonhos relativos à Educação andarem por si só, gosto de reler Neil: Alexander Sutherland Neil. Especialmente o livro citado na epígrafe deste artigo! Nele, encontro alento para continuar bradando minhas e suas idéias. Trata-se de um relato sobre a Escola de Summerhill, fundada no Reino Unido, em 1921, por este escritor, jornalista e educador britânico, licenciado em Letras, nascido na Escócia, em 1883 e que viveu entre nós até 1973.

Neil propunha que as crianças e os jovens devem ser estimulados a aprender em um ambiente de liberdade e de responsabilidade. Muito do que ele prega é certamente controverso e é rotulado como heresia, por quem gosta de comandar com ferro e fogo. Entretanto, um dos mais importantes ensinamentos que ele nos deixou, é o respeito integral ao aluno, respeito às suas diferenças.
Summerhill, antes de tudo, é uma escola onde - ela ainda funciona, mesmo depois da sua morte - se respira liberdade e as crianças são confiantes e felizes. Liberdade não significa licenciosidade, o respeito deve ser mútuo. Um professor não tem o direito de exercer força contra uma criança, nem a criança tem o direito de usar de força contra o professor. Ela não tem o direito de impor-se aos adultos só por ser uma criança, nem pode suportar as pressões que, de várias maneiras, lhe impõem o mundo adulto.

Erich Fromm, no prefácio da obra, posiciona-se a favor da liberdade para as crianças, embora ela tenha sido quase sempre pervertida, ao longo dos tempos. Segundo ele, para entendermos a natureza da liberdade é necessário que estabeleçamos a diferença entre autoridade manifesta e autoridade anônima. A primeira é exercida direta e explicitamente; quem a exerce fala com franqueza com a pessoa que lhe está submetida. Já a autoridade anônima acontece num clima de faz de conta que não há autoridade, que tudo é feito com o consentimento de quem obedece.

Antigamente, na maioria das Escolas, a autoridade manifesta usava inclusive a força física e hoje a maioria dos professores empregam a manipulação psíquica.
A modificação da autoridade manifesta do século XIX, para a autoridade anônima do século XX, foi determinada pela necessidade de organização da sociedade industrial. O sistema acaba criando homens com gostos padronizados, que podem ser influenciados facilmente, cujas necessidades podem ser conhecidas antecipadamente, porque foram inculcadas e geradas pelo próprio sistema. Embora pareça, a autoridade não desapareceu, nem perdeu o vigor, apenas foi transformada de manifesta em anônima, de persuasão, de sugestão, auxiliada primorosamente pela mídia.

Na escola não é diferente, os mesmos artifícios são usados na Educação. A criança é forçada a engolir a pílula, só que agora açucarada! Pais e professores têm confundido a autêntica educação, despida de autoritarismo, com educação por meio de persuasão e coação ocultas.

Fromm levanta uma série de princípios da Escola de Summerhill, onde a autoridade não mascara um sistema de manipulação, porque Neil mantém a fé inquebrantável na bondade da criança, acredita que ela não nasce deformada, covarde, nem autômata, destituída de alma, e sim com um enorme potencial para amar a vida e por ela interessar-se. Para ele a Educação deve visar, acima de tudo, a felicidade, e a felicidade implica em estar interessado na vida, atender ao seu apelo com toda a personalidade, não apenas com o cérebro.

O desenvolvimento intelectual não é o bastante. A educação deve privilegiar, além disso, o emocional, por isso devendo estar entrosada com as necessidades psíquicas da criança.
Em Summerhill os alunos não são obrigados a freqüentar as aulas, mas uma vez que se decidam por freqüentá-las, são obrigados a manter a disciplina e a respeitar aos seus colegas e professores. Segundo Neil, perde-se muito tempo forçando crianças a freqüentar aulas antes do tempo, quando seus interesses e atividades não condizem com estar sentado em uma sala de aula, reprimindo sua natural energia e vontade de explorar o mundo com suas próprias mãos. Crianças de sete a dez anos raramente se interessam em assistir aulas, porém o tempo supostamente perdido é rapidamente recuperado quando se decidem a freqüentá-las.

Nas palavras do educador: “Logicamente,Summerhill é um lugar onde as pessoas que têm habilidade inata e desejo de se fazerem eruditas, serão eruditas, enquanto as que apenas, sejam capazes de varrer ruas, varrerão ruas, mas, até agora ( 40 anos depois da sua fundação), não produzimos nenhum varredor de ruas. Não escrevo isso para me dar ares, pois antes ver a escola produzir um varredor de ruas feliz do que um erudito neurótico”.

A Escola é administrada pelos próprios alunos que, em assembléias semanais, decidem as regras do seu funcionamento. Não raro, crianças com apenas sete anos são líderes das assembléias e são respeitadas pelo grupo todo. Muitas teorias são feitas sobre o que uma escola deve ensinar, o que é outra das grandes tragédias da educação, segundo Neil, que acha que a humanidade está doente e essa doença decorre do tratamento repressivo que as crianças recebem numa sociedade patriarcal. Toda a criança tem direito à liberdade; um grupo de crianças normais se auto-regula, estabelecendo em conjunto as próprias normas; excesso de liberdade constitui licenciosidade, que consiste em ultrapassar os limites alheios.

Estou convicta de que Summerhill acerta em cheio ao propiciar meios para que seus alunos sejam confiantes e felizes. Aprender, o que quer que seja, fica muito mais fácil nestas condições. A função de uma criança é viver a sua própria vida, não a vida que seus pais ansiosos pensam que ela deve viver, nem uma vida de acordo com os propósitos dos educadores que pensam que sabem tudo e o que é melhor para seus alunos..

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