segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Que tal uma sociedade que conviva com o amor, a integridade e a solidariedade?


Gladis Maia

Possuir uma consciência humanista é ter a disposição para ouvir a voz de sua própria humanidade, independente de ordens dadas por qualquer outra pessoa. Erich Fromm, in a Revolução da Esperança.

A preocupação principal, ao longo dos tempos, tem sido o evitamento da loucura, afora isto, o homem tem podido optar: por uma vida entesourada - acumulando o que considera valioso - ou de produção; pelo amor ou pelo ódio; pelo ser ou pelo ter. E ao optar por quaisquer dos valores o homem forma uma estrutura de caráter, no qual certas orientações são dominantes sobre outras, necessariamente, secundárias.

Segundo a Psicanálise, a maioria das pessoas gostaria de ser agressiva,competitiva, bem sucedida no mercado, apreciada por todos e - ao mesmo tempo, como se fosse possível – terna, amorosa e íntegra. Também gostaria de viver numa sociedade que valorizasse a cultura, a paz e os valores espirituais, além da produção e do consumo materiais, do poder militar e do político...

São idéias irreais, incongruentes! Na realidade, os traços bonitos só servem mesmo para encobrir os feios. Realizada a escolha, e retirada a fantasia, restam poucos valores que, pelo seu conjunto, não deixam dúvidas quanto à estrutura que preferimos, bem como o caráter que possuímos...

Fromm, no livro citado na epígrafe, explica que trazemos dentro de nós toda a humanidade e, por isso, somos, interiormente, tanto santos como criminosos, embora em graus variáveis. Nada do que percebemos em outra pessoa é diferente de nós mesmos! Precisamos nos libertar da estreiteza de nos relacionarmos apenas com a família e com alguns eleitos, porque conhecer a humanidade com empatia e compaixão exige que nos livremos dos laços tacanhos de determinada sociedade, cultura ou raça e que penetremos até as profundezas da realidade existente como um todo e na qual somos apenas humanos.

Se queremos bem aos nossos semelhantes, se somos verdadeiramente humanistas, devemos nutrir compaixão, por toda a humanidade, empatia e interesse. Ou seja: é preciso que nos abramos para vivenciar com os outros uma inter-relação onde experimentamos dentro de nós o que é experimentado pela outra pessoa, numa atitude relativamente constante de compreensão intelectual, emocional e sensual do mundo exterior, transcendendo nossos egos, abrindo-nos e interessando-nos por ela, como refere a palavra interesse, que vem do latim, e significa estar entre.

Para o conceituado humanista Erich Fromm, valioso e bom é tudo aquilo que contribui para o maior desdobramento das faculdades específicas do homem, favorecendo à vida. Negativo ou mau é tudo o que estrangula a vida e paralisa a atividade do homem. Segundo ele, todos os princípios das religiões humanistas, como os do Cristianismo, do Judaísmo, do Budismo ou do Islamismo, bem como os dos grandes filósofos humanistas – dos pré-socráticos aos pensadores da atualidade – convergem para valores tais como os de: amar ao seu próximo; buscar o conhecimento da verdade; e vencer a sua própria cobiça, constituindo assim metas comuns a todos os sistemas humanistas filosóficos e religiosos do Ocidente ao Oriente.

No mundo moderno, individualista, onde a ênfase é cada vez maior no ter do que no ser; no cada um por si e Deus por todos; onde o maior come o menor, faz-se mister que o homem mantenha como seu norte os valores humanistas para orientar suas ações e sentimentos.

Embora nos discursos dos políticos e nas pregações religiosas em geral se empreguem valores como o amor, a compaixão, a esperança, a ternura, a responsabilidade, a liberdade política e religiosa, na verdade os mesmos transformam-se apenas em ideologias, não sendo eficazes na motivação do comportamento humano.Na realidade os valores inconscientes que motivam diretamente o comportamento humano são aqueles criados no sistema social, entre nós, traduza-se por: valores de propriedade, de consumo, de posição social destacada, diversão, emoção, etc.

A atitude humanista tem conseqüências saudáveis e múltiplas. No domínio moral, conduz à tolerância para com seus semelhantes, respeitando-se suas singularidades. No domínio político e social, supõe que o progresso auxilie na constituição de uma sociedade mais humana, livre e igualitária, onde todos tenham direito a vez, ao voto e a voz, já que um dos princípios compartilhados pelos humanistas é a solidariedade de todos os homens e a lealdade para com a vida e a humanidade, que sempre devem preceder a lealdade à qualquer grupo particular. No domínio estético estimula a literatura a exprimir, com propriedade cada vez maior, a essência ideal do homem. E na filosofia reconhece na pessoa um valor sagrado.
Não nos iludamos porém que o homem seja considerado pela maioria como a medida de todas as coisas e que em geral ele próprio tenha a noção de conhecimento de si mesmo, sem antes estar preparado para tal.O homem só pode descobrir valores quando já atingiu um certo grau de desenvolvimento social e econômico, que lhe dê tempo e energia suficientes para refletir, para pensar exclusivamente para além dos seus propósitos simples de sobrevivência. Se ele não tem na mesa o pão para toda a sua família,fica muito difícil começar a pensar no vizinho próximo, quanto mais no distante...

Em tempos de selvageria capitalista como falar de verdadeiros princípios humanistas e não ser encarado como um louco sonhador? Se todos temos o direito de viver com as condições básicas necessárias à vida, como encarar a Etiópia, por exemplo, para não se falar de recantos brasileiros onde a economia governamental e a orientação religiosa permitem a existência da prostituição e do trabalho infantil?! Já tarda a hora de agirmos!!! Estamos às vésperas do individualismo vencer todas as batalhas... Amanhã, poderá ser tarde!

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