segunda-feira, 15 de setembro de 2008

A ética puritana, que durante séculos orientou a vida da maioria das pessoas no mundo, foi pro brejo...



Gladis Maia


O valor de um homem pode ser medido
pelo que ele faz quando não tem nada para fazer. L.P. Ingle.


O puritano estava comprometido com a obra do Senhor, o que na prática queria dizer: ser produtivo. O puritanismo era um credo rígido que desencorajava qualquer frivolidade. Proibia os jogos de carta, os bailes, as roupas deveriam ser sóbrias e as pessoas deviam manter-se à uma certa distância respeitosa uns dos outros... Criar os filhos naquela época era bem mais fácil, haviam as regras que eram seguidas sem discussão, e ponto. O difícil era conseguir uma boa colheita. A vida era árdua, a luta pela sobrevivência deixava pouco tempo para a diversão ou para o faz de conta.

Mas seria um erro pensar que o modo de vida do puritano tivesse sido totalmente isento de prazer. Eram prazeres mais simples, é claro, basicamente consistiam na sensação agradável que se tem ainda quando a vida flui serenamente, em harmonia com o meio-ambiente, entre algumas populações agrárias.

A industrialização provocou uma abundância que lentamente expandiu a visão puritana e a ciência com sua tecnologia mudou o conceito de produtividade. O trabalho manufaturado cede ao processo mecânico,
resultando, entre outras transformações, na perda dos princípios morais que antes davam sentido ao modo de vida e á ética puritana.

As reações são sempre extremistas. Hoje em dia, a ética do divertimento adotou como lema o vale-tudo. Seus adeptos olham as pessoas que se contêm como recalcadas, renegadas, porque questionam o entusiasmo e abalam a credibilidade do vale-tudo. Da mesma forma antigamente os puritanos criticavam os que fossem dados às diversões, acusados de seguidores do demônio, a origem de todas diversões...

Mas, sem nenhuma conotação religiosa, algumas diabruras em nossas vidas, em todas as épocas fazem bem à saúde. A verdadeira diversão aumenta nossa alegria de viver. Só não vale o vale-tudo! Parcimônia e canja de legumes não fazem mal a ninguém, trocando o ditado, porque galinha faz mal aos vegetarianos. E por isso, a infância sempre foi considerada, universalmente, como a época mais feliz da vida, embora as crianças não percebam que são felizes. Coisa que pensam os adultos, evidentemente.

Aliás as crianças nem sabem o que a palavra felicidade significa. Mas o que é divertido - ou não - isso sim elas sabem. No corpo e na alma! Os adultos costumam idealizar suas infâncias porque retrospectivamente surgem em suas lembranças como anos felizes, sem preocupações e sem os problemas que devastam a vida adulta. O que além de ser uma inverdade, como o passado e o futuro, que não existem, pois não passam de sonhos, afinal só o presente é real, as crianças também têm os seus problemas e sofrem para resolvê-los, embora sofram diferentemente de nós, que ficamos a nos lamuriar e a tirar proveito da vitimação, por bem mais tempo do que elas.

Uma das razões para não termos prazer no que fazemos, é que tentamos nos divertir com coisas sérias e levamos a sério as atividades que são mera diversões. Por exemplo: o jogo de bola ou de cartas, que geralmente não traz conseqüências graves – ou pelo menos não trazia até pouco tempo atrás - deveria ser praticado só para passar o tempo. Lazer: diversão! Entretanto, as pessoas se entregam a essas atividades como se fosse um caso de vida ou morte, os que jogam e os que assistem, esperando pelos resultados. Isto sem falarmos da existência da máfia do futebol, das torcidas-gangues, do vício do jogador de cartas que perde tudo no jogo ...

Não que não tenhamos que ser sérios ao jogar ou brincar. As crianças levam a sério suas brincadeiras e se divertem muito com isto. E nossas atitudes, por outro lado, com as atividades que realmente são sérias, como o sexo, a ingestão de drogas ou a direção de automóveis em alta velocidade, amiúde são praticadas como diversão ... A festa ilícita com bebidas alcoólicas, a volta num carro roubado, o vandalismo, são escapadelas que dão aos participantes a ilusão de estarem se divertindo. Geralmente os resultados de uma escapada são bem mais sérios e poucas vezes agradáveis.

A ética de diversão, segundo a Psicologia, é uma tentativa de recuperar os prazeres da infância e do faz-de-conta, com o qual a criança pode se entregar totalmente ao prazer. Quando um adulto faz de conta que está se divertindo, inverte o processo, fazendo de conta que atividades sérias, como beber e sexo, são diversão, transformando assuntos como ganhar a vida ou criar uma família em brincadeira. Não pode dar certo!

O comprometimento total com o que se está fazendo é um das condições básicas para o prazer, como as crianças, que se envolvem completamente com os jogos e brincadeiras. A criatividade adulta emerge das mesmas fontes e com a mesma motivação das crianças, o desejo de prazer, a necessidade de auto-expressão, causa prazer. Portanto, no trabalho, no dia a dia, vale a pena lembrar como você brincava, quando era peque

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