domingo, 30 de setembro de 2007

Eles são da geração pós-TV e aprendem diferente de nós

Gladis Maia

Quem ouve música sente a sua solidão imediatamente povoada.Robert Browning

Pierre Babin e Marie-France Kouloumdjian in ‘Os Novos Modos de Compreender’, levantam a hipótese de que uma nova cultura está nascendo, baseados numa pesquisa que realizaram, na década de 80, na América do Norte, África e Ásia, envolvendo jovens e educadores de horizontes e idades diferentes, professores do ensino superior e de 2º Grau e sociólogos. Ficaram visíveis as rupturas de valores e de comportamentos entre os jovens e os adultos, perceptíveis em canais como na linguagem e modos de expressão em geral, na relação com o mundo, nas suas percepções essencialmente diversas da geração anterior.
Os jovens não são mais contra estes ou aqueles valores em relação aos quais tentam definir sua identidade. Eles ‘estão em outra’, num sistema diferente, dentro do qual se inserem de modo original e que, pouco a pouco, constitui uma verdadeira e nova cultura. Os jovens da década de 80 ( e 90 e do início do século XXI) diferem bastante dos contestadores que os antecederam, não são contra, nem a favor.O discman no ouvido é uma imagem sugestiva, não da revolta entre gerações, mas da distância que as separa. A oposição - marca característica do choque de gerações - metamorfoseou-se em ‘desnorteio’; o combate sócio-político, transformou-se em salvaguarda da ecologia; a organização revolucionária deu lugar às ações pragmáticas; as ideologias foram trocadas pelos discos. Não há agressividade! há apenas distância e uma certa impotência para comunicarem-se! Não há rompimento com a família, ou pelo menos é bem mais leve do que antes. A própria incomunicabilidade não é tão radical assim. ‘Cada um na sua’, como eles mesmos dizem.
Muitos comentários desabonadores foram feitos pelos entrevistados professores e pais) a respeito dos jovens da década de 80. Os pais se queixam que os filhos estão sempre com ‘o som a mil’, que estudam em frente à TV ou ouvindo música, estão sempre com seus discos - hoje cds - TV ... ‘Na deles’, fugindo do diálogo! Os adultos se queixam de que os jovens tornaram-se incapazes de acompanhar por muito tempo uma explicação, um discurso qualquer de conteúdo intelectual. Após 15 minutos já estão em outra ...
As principais queixas da cultura tradicional à jovem geração são sobre: o nível de inteligência’ , que teria baixado. Dizem que eles ‘são incapazes de se concentrar’; ‘colocam tudo no mesmo pé’; ‘são passivos’, ‘há uma perda de raciocínio e do espírito crítico’, ‘falam sobre tudo, mas nada sabem’; “vivem em outra’. Para os pedagogos e psicólogos atribuem a queda da atenção entre os estudantes, ao fato de muitas crianças dormirem pouco, por ficarem vendo TV até tarde.Esta mudança de hábito gerada pela TV, com seu peculiar bombardeio de informações, submerge-os e impede-os de se concentrarem num ponto especial. A civilização eletrônica acelera os ritmos: a própria música é tocada com mais rapidez do que antes. Mas, em compensação, esses jovens têm um excelente grau de concentração quando se trata de algo do seu interesse genuíno. Concentram-se nas suas músicas, nas suas histórias em quadrinhos, nos seus filmes, nos seus vídeos.
Pierre e Marie-France relatam que numa das experiências da pesquisa assistiram o filme Woodstock com jovens alunos, que fascinados confessaram viver quatros horas de paraíso; e alguns acabaram vendo o filme cinco ou seis vezes. Já quando os autores assistiram o mesmo filme, com alguns educadores, muitos destes confessaram ter dormido durante a exibição. Tantos outros reclamaram por que levaram quatro horas para dizer o que poderia ter sido dito em 20 minutos, na sua concepção... Pergunta-se: quem foi passivo, quem foi mesmo que não se concentrou? Quem tem pressa?
Se é difícil para os jovens concentrarem-se em conceitos, discursos desprovidos de ritmos, imagens, sons, vibrações, não é o caso quando esses elementos estão presentes. E se o conhecimento pela TV fosse uma forma de entrar na vida divertindo-se, passeando como numa floresta? E se esse conhecimento pela televisão fosse uma familiarização, uma aquisição, caminho na verdade insuficiente, mas necessário para um conhecimento e uma enunciação mais profunda? Portanto: um outro modo de aprender!
Muitas queixas sobre a dificuldade de os alunos expressarem-se na sua língua nacional assemelham-se bastante às dos professores de português no Brasil onde a literatura inspiradora agora são as revistas, o rádio, a TV e o cinema. Escrevem como se estivessem falando. Apresentam dificuldade de compreensão de vocabulário. Usam linguagem oral nas redações. Fazem frases tipo slogan. A página escrita não tem consistência, nem permanência, é como se fosse um programa de TV. Não consideram mais a ortografia, escrevem as palavras como são pronunciada. Só conseguem guardar da dissertação uma palavra-chave, uma informação. Seus textos são cheios de abreviações estranhíssimas e repetições, que pontuam a frase, ou suprimem as palavras que faltam.
Os alunos americanos e os africanos, da pesquisa, em suas falas expressavam bem os prenúncios da incorporação da linguagem audiovisual, ou seja: falam com frases breves, expressões pesadas e sonoras,usam muitas onomatopéias. Usam acentuação vigorosa e ritmos irregulares; palavras e orações inacabadas – inter-cortadas ou completadas com gestos e caretas, supressões de verbos, de artigos e de pronomes. Mas não se enganem: esses jovens não apresentam falta de lógica, eles possuem outra lógica, diferente da linguagem padrão culto, mas ainda assim lógica.Voltaremos a esse assunto ainda nesta semana!

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