sexta-feira, 28 de setembro de 2007

A nova linguagem nas falas e textos teria sido gerada pelo rádio e a TV?


Gladis Maia
Sabemos que de tanto trabalhar sempre o mesmo músculo, esse músculo se desenvolve. Assim também é com o comportamento intelectual. A ginástica interna, consciente ou não, que a prática da linguagem audiovisual desenvolve ao longo do tempo, determina uma maneira de compreender e de aprender, na qual a afetividade e a imaginação não poderiam, estar ausentes. Babin e Kouloumdjian (1989)

A maioria dos nossos alunos possui muita dificuldade para exprimirem idéias que não tenham raiz sensorial, ressonância emocional ou contorno visual. Nascidos e educados pela era audiovisual eles seguem as regras desta linguagem nos trabalhos da escola, onde suas produções costumam não ser bem-vindas. Isto é conseqüência do que eles sentem ao ver/ouvir a programação da telinha... É necessário que se compreenda que na escrita do audiovisual, nos seus roteiros e scripts, há a interpenetração íntima dos elementos cognitivos e afetivos. Mesmo que se trate de uma aula de economia pela televisão, por exemplo, essa aula reveste-se de profundo caráter afetivo, dependendo da personalidade do professor, do brilho dos atores, do som das vozes, da focalização dos rostos, do fundo musical, dos gestos e do conjunto do espetáculo. Exatamente como um bom professor na classe, talvez se dissesse ... Mas não é assim, é muito mais, pois é próprio do meio eletrônico ampliar a presença e a vibração sensorial. Pelo fato do visual e dos diálogos terem menos importância, num audiovisual, uma música atraente, alguns efeitos sonoros, os timbres e os efeitos de voz, as freqüentes mudanças de interlocutores são os elementos que primeiramente captam sua atenção. Sem contar o alto nível de atividade física ou de ação. A própria imagem e a experiência das relações é mais importante do que o discurso. Se observarem, é essa a ordem que preside as seqüências dos telejornais! Se vai de notícia a notícia, sem lógica aparente, e é o telespectador que liga os pedaços, se pelo menos o conjunto lhe deu alguma experiência unificada, é claro! Enquanto no discurso habitual de um livro ou de uma conferência, a lógica é inscrita objetivamente na pontuação e nas conjunções coordenadas, nos audiovisuais as seqüências não têm lógica dedutiva. A tonalidade afetiva do começo, é que vai determinar a compreensão do telespectador. Na etapa de compreensão ou elaboração do sentido, aquele que recebeu a mensagem da confusão inicial, passa a elaborar o que viu e ouviu. Quando acontece a reflexão diante e sobre o que se viveu e sentiu, se está diante do tempo do distanciamento. Tempo da conceitualização, da passagem às idéias gerais, da apropriação ou reconstrução na linguagem do espectador. E, enfim, surge o julgamento crítico sobre o conteúdo, a forma, a linguagem, a técnica, os processos utilizados, os fundamentos comerciais, políticos, culturais, econômicos,etc., postos em jogo. Esse é um momento importantíssimo! Se o audiovisual constitui uma ameaça, é porque muitos espectadores nunca chegam a essa etapa. Assim, muitos deles só retém o que convém à sua personalidade e ao seu papel. Num filme sobre técnicas de venda, por exemplo, um vendedor vê alguns de seus defeitos e confirma algumas de suas qualidades. Ele esquece pelo menos 60% das outras informações. E assim cada um em sua área de interesse fará a seleção.... Todas essas influências fazem com que os jovens sintam a necessidade de uma outra linguagem, mais livre, mais imaginativa, mais rápida. Treinados para a distância afetiva e para desconfiança da imaginação, nós, os homens da Era Gutemberg vimos com maus olhos a Civilização Audiovisual Eletrônica, que liga intimamente a sensação à compreensão, a coloração imaginária ao conceito. Mas as coisas mudaram e é preciso cuidado e disponibilidade para aceitar essa nova forma de ver e entender o mundo. O espírito analítico, rigoroso e lógico do professor ocidental é que dificulta a aceitação do meio audiovisual como promotor de conhecimento no seio da escola. A maioria dos educadores até rechaça a TV, vendo-a apenas como sinônimo de lazer, de diversão e de brincadeira. O fato deste meio trabalhar o conhecimento e a informação de uma forma quase física, esculpida na realidade, incomoda aos intelectuais, que acabam não levando em consideração nem mesmo a adoração das crianças e dos adolescentes pela telinha mágica. A questão básica é como guardar o essencial da aquisição de Gutemberg e, ao mesmo tempo, assumir os novos modos e valores da linguagem audiovisual? É este o desafio que a sociedade atual, e, em particular a Educação, precisa aceitar! Se os jovens forem abandonados à sua linguagem, com a força interna de desordem e de desagregação que carrega consigo, o resultado será o assassinato das línguas nacionais cultas. Porém, recolocá-los dentro do discurso literário tradicional, em raríssimas exceções, será impossível. Se é necessário a imersão total do telespectador para a compreensão de uma mensagem audiovisual – corpo/alma/telinha - faz-se mister a estada num segundo tempo, o tempo de distanciamento, para que ele chegue a uma certa verdade do conhecimento. Como referem os pesquisadores da epígrafe, in ‘OS NOVOS MODOS DE COMPREENDER’, que alertam que um grave perigo espreita as novas gerações: ficar na sensação, que é a primeira etapa pela qual passa o telespectador. O papel da Escola é educar para o audiovisual, para a apreensão do segundo tempo, porque uma escola que se propusesse somente a trabalhar com o audiovisual e continuasse o sistema de imersão além de 30% faria apenas demagogia e passaria à margem da sua função. Que a escola, que, ao longo de sua história, já foi forte em ensinar os mecanismos de distância reflexiva, crítica e científica, com os instrumentos de ontem – especialmente a escola particular – e com seus métodos tradicionais se especialize para estar apta a resolver os problemas que nos afligem hoje, no tangente a essa transição na área da linguagem.

Nenhum comentário: