terça-feira, 9 de outubro de 2007

Todos podem dominar a tristeza, exceto aquela pessoa que a sente.

Gladis Maia
( ...) os sentimentos de uma criança são mais voláteis do que os da maioria dos adultos; ela pode, com relativa facilidade, passar, ou deixar que a façam passar, da depressão ao bom humor. Bruno Bettlheim.
Os pais e muitos professores não costumam dar crédito à profundidade dos sentimentos das crianças em torno de si. Dificilmente avaliam corretamente o quanto elas sofrem, quando acreditam que elas não têm razão para isso, na sua concepção. E isso é ruim, não só entre as crianças pois independentemente da idade, as decisões de terceiros sobre o que devemos ou não sentir profundamente são vivenciadas por nós como uma demonstração do pouco que nos conhecem e do quanto se importam com nossos sentimentos.
Bettelheim explica que é desastroso quando os adultos pensam que podem decidir quais os assuntos que uma criança deve levar ou não levar a sério. Os adultos – e, especialmente, os pais - projetam suas incertezas ou ansiedades nos filhos e muitas vezes tentam animá-los quando estão muito tristes. Muitas vezes, o conseguem, não só porque a criança está numa posição fraca para opor resistência, mas, principalmente, porque o desejo deles de fazê-la feliz é para ela uma indicação da sua importância para eles. Só não podemos julgar que isso significa que as crianças sintam dor ou desconforto em grau menor do que os adultos. Mesmo que a criança pareça ter esquecido momentaneamente o seu sofrimento - pela perda de um amigo, por exemplo - quando a dor volta, ela sente-se pior ainda por ter esquecido seus sentimentos mais profundos por um momento.
O psicanalista esclarece que mesmo que a infelicidade da criança seja aliviada temporariamente ela sente-se magoada ao refletir, quando percebe que seus sentimentos foram considerados superficiais de tal forma que ela poderia com facilidades abandoná-los, desde que alguém a animasse. Se levamos realmente a sério os sentimentos das crianças, não devemos animá-las quando estão infelizes, lamentando uma perda.
É só trabalharmos com a empatia: quando choramos a perda de alguém querido, consideramos falta de sensibilidade se alguém tenta encorajar-nos a sair de nosso luto, não? Qualquer um de nós imagina que um amigo verdadeiro deve respeitar o nosso sentimento de perda. Desejamos que sofra, que chore conosco, se possível, mas nunca que tente nos alegrar à força... Assim também acontece com as crianças. Embora elas não nos possam dizer o quanto ficam ressentidas quando consideramos sua perda leve demais para chorarmos com elas. Elas não nos dizem por que sentem que podem ser mais magoadas ainda por nós.
Independente do seu comportamento explícito, a criança sempre reage interiormente ao nosso esforço de tentar animá-la. Por isso, é muito importante que prestemos mais atenção a elas e a seus sentimentos e que tenhamos a mais profunda solidariedade para com as suas infelicidades, mostrando-lhes também que as julgamos capazes de superar essa infelicidade com o passar do tempo, como acontece conosco.
No tangente aos sentimentos, tanto dos adultos como das crianças, Bettelheim alerta-nos que todas as crianças são profundamente afetadas pelas inseguranças dos pais, que somadas à sua compreensão limitada do mundo, à sua capacidade de enfrentar os problemas da vida - e acima de tudo às dúvidas sobre sua capacidade de serem amadas - pioram tudo no seu desenvolvimento, especialmente o emocional. As crianças só conseguem dominar essas inseguranças quando são impulsionadas pela crença positiva que seus pais têm nelas e em sua capacidade de conduzir a vida com sucesso, se não hoje, mais tarde, quando for necessário agirem sozinhas.
Mas quando os pais expressam dúvidas a respeito de como seu filho está se saindo ou se sairá no futuro tudo acaba piorando, pois essas são as únicas diretrizes que as crianças têm e nas quais podem confiar, porque sabem que os seus pais conhecem muito mais sobre o mundo e seus problemas... Assim, pais que se preocupam demasiadamente com o filho e com seu futuro criam exatamente aquilo que mais temem: um filho profundamente inseguro.
O psicanalista nos alerta ainda para as confusões que fazemos em nossas mentes “esclarecidas”, pois agora que sabemos que as crianças tanto amam, como rejeitam, aos seus pais, temos uma tendência a atribuir tudo à rejeição. Mas muitas coisas que parecem ser rejeição não o são, são apenas frustrações da criança com sua inabilidade. Em muitos casos, os acontecimentos assim pressagiados, seriam apenas decepção da criança consigo mesma, como pensavam os antigos, antes que ficássemos psicanalisando tudo que vemos e julgamos negativo....
Bettelheim nos relembra que se uma criança derrubasse sua comida no chão, há décadas atrás, não era tida pela mãe como irritação contra ela ou insatisfação com o mundo, ou ainda prenúncio de sua futura incapacidade para enfrentar a vida. A mãe apenas considerava inabilidade dela e a ajudava a alimentar-se corretamente ... Hoje, quando suspeitamos que um incidente deste possa seu um gesto deliberado de irritação ou desafio, toda a boa vontade criada pelo sentimento de que somos importantes para nossos filhos cai por terra. Logo pensamos que ele nos rejeitou ou ao alimento que preparamos com tantos cuidados para ele ... “Piramos” na interpretação, vendo rejeição onde só havia falta de destreza infantil!
Se antigamente os nossos ancestrais se preocupavam com a sobrevivência de seus filhos, que trabalhavam junto com eles para manter economicamente a família, nos dias de hoje, os laços emocionais na família é que dão a tão almejada segurança e felicidade. Quanto mais fortes forem esses laços familiares, mais provável será que os filhos se tornem pessoas fortes e seguras para enfrentar a vida. O melhor que temos a dara às crianças, enquanto elas se preparam para a vida, é a nossa confiança nelas e um grande sentido de valor próprio.

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