segunda-feira, 1 de outubro de 2007

Escola Viva, um espaço de criação em São Paulo, destinado à incluir.

Gladis Maia
Encontrei uma classe extremamente heterogênea: alunos de comportamento passivo, alunos extremamente agitados, alunos bons, alunos que liam e não escreviam, alunos que não liam e que não escreviam e, entre eles os que se recusavam a ler, escrever, a fazer qualquer atividade proposta. Alguns se rastejavam pela sala, alunos que escutavam errado sem ter problemas auditivos. Darcy, professora.
A Escola de Ensino Fundamental Gal. Osório, Vila Califórnia, foi a primeira escola inclusiva da Prefeitura de São Paulo. O processo iniciou-se em 1997, por iniciativa de Arlete Persoli, diretora à época e sob a orientação da prof. dra. Leny Magalhães Mrech, cujo trabalho – durante o período de 4 anos - passou a constituir o estudo de caso que documentou sua tese de livre docência, na USP. Eram então 689 alunos, 27 com NEE, sendo assim distribuídos: deficiência mental, 5; deficiência auditiva,1; distúrbios emocionais, 2; deficiência física, 2; e 16 distúrbios de aprendizagem.
O processo iniciou-se logo após o 1º projeto Escola Viva da PMSP, quando mais de 170 escolas, professores das salas de SAPNE, Salas de Apoio aos Portadores de Necessidades Educativas Especiais e SAP, Salas de Apoio Pedagógico aos alunos com distúrbios de aprendizagem, das antigas EMEDAS, Escolas Municipais para o Atendimento dos Deficientes Auditivos e coordenadores pedagógicos.
A direção e equipe técnica foram o grande elo de ligação entre a escola e a comunidade, exigindo um trabalho comprometido e cuidadoso com os participantes do projeto, envolvendo: acolhida, escuta, retorno dos conteúdos, síntese e principalmente a sustentação do desejo por um projeto de Educação Inclusiva e Psicanálise, cujos objetivos centrais giravam em torno de: ‘...um sonho por uma Educação melhor, por uma escola de qualidade, pela implantação do mesmo desejo nos alunos, pais, funcionários e comunidade,’nas palavras de Leny.
Nas reuniões de assessoria eram estudados conteúdos vinculados à Psicanálise e Educação Inclusiva, através de autores como Vygotsky, Wallon e Lacan. Em horários coletivos, os professores estudavam outros conteúdos sob a responsabilidade das Coordenadoras Pedagógicas. Nas entrevistas individuais os professores podiam colocar as dificuldades com os alunos, com os conteúdos a serem trabalhados, acompanhamento de estudos de casos, onde relatavam os avanços atingidos com cada aluno.
‘Procuramos ver o professor em sua singularidade, bem como fazer com que ele tecesse os caminhos que achasse necessário para sua participação dentro do projeto. Esta prática se estendue a todos os segmentos, incluindo alunos, funcionários e pais,” explica. Esta ampla conversação entre os participantes da escola foi realizada, segundo Leny, com a intenção de liberar a palavra que geralmente fica presa na escolas por medo de falar o que se pensa, o que se deseja, o que se necessita.
A Coordenadora Pedagógica da Escola relata que a indisciplina era um dos maiores entraves em sala de aula e que os alunos indisciplinados eram excluídos da mesma e o índice de repetência era muito alto, pois a forma de avaliar o aluno não levava em conta o seu progresso e o processo de aprendizagem. A resistência dos professores no início foi muito forte por parte de todos, já que os primeiros textos e palestras apresentados traziam uma reflexão para os problemas que a escola enfrentava e a prática pedagógica de cada um, prática que não estava dando conta das dificuldades apresentadas pelos alunos. Como refere Leny, é muito difícil para o professor aceitar que existem problemas na escola, na sua situação, e que é preciso mudar: ‘Os educadores, diferentemente dos psicólogos e psicanalistas, não estão acostumados com a supervisão do seu trabalho, o que faz com eles sintam uma dificuldade maior em refletir a respeito da sua prática. Este é um problema que os pedagogos institucionais já haviam identificado há muito tempo’. Ela salienta que: 'Se não fosse banal, poderia julgar-se espantosa esta atitude dos professores que fazem ponto de honra na negação da existência dos conflitos na sua sala de aula.'
Essa coluna não é suficiente para resumir o que foi a implantação da inclusão na General Osório, com sua inúmeras parcerias que se estabeleceram com a comunidade, indo desde a associação de instituições como a igreja, hospital, passando pelo de trabalho voluntário.O ponto alto a ser destacado foi o clima de cordialidade que se estabeleceu na escola, o grupo docente ficou bem mais amigo, trocando experiências e materiais, uns querendo ajudar aos outros, um verdadeiro entrosamento entre alunos, professores, direção, coordenação, funcionários, pais. A inclusão resgatou o valor da solidariedade e da cooperação.
Foram muitos os depoimentos comoventes colhidos por Leny, dos quais selecionei alguns. O primeiro é da mesma professora que assina a epígrafe, Darcy: ‘ A aluna Franciele, 13 anos, não conseguia dar opinião alguma a respeito de um pequeno texto trabalhado em classe, pois lia e não entendia nada. Sentamos juntas e, na lousa, coloquei outro texto com apenas oito linhas curtas. Fiz com que ela lesse palavra por palavra até formar a frase, muitas vezes. Fiquei uma aula inteira para que ela pudesse ler e entender. De repente ela me disse: ‘Ah! Professora, é isso? Então eu já sei’. Havia nela um sorriso de felicidade e de confiança em si. Foi a descoberta da leitura e da escrita para ela. Hoje ela escreve pequenas histórias.'
Já a professora Zuleica diz: ‘Muitas vezes questionei como poderia trabalhar cada aluno, se as classes eram lotadas e eu nem conseguia saber o nome de cada um. Porém, aos poucos, fui percebendo a importância de trabalhar individualmente com cada aluno. Depois de muita reflexão e de rever minha prática pedagógica, para experimentar o que havia aprendido, por sugestão da profa. Leny, criei um projeto ‘Arte na Escola’. São oficinas de arte, montadas com a ajuda de profissionais da escola e da comunidade, que tenham habilidades. O público é muito diversificado, desde crianças com distúrbios emocionais graves a funcionários, professores e pais da comunidade. Tenho aprendido e estudado bastante. O bom das oficinas é que mudamos os papéis constantemente, ora sou professora, ora sou aluna. Em muitas situações,quando me vi ‘atrapalhada’ para realizar algum trabalho, tive a ajuda espontânea dos alunos. Neste contexto , entendi que um professor não tem que saber tudo, mas tem que ter a responsabilidade de estar questionando a sua prática e o seu saber.’ Adorei tomar conhecimento desta pesquisa!Se você também gostou e quiser ler o texto na íntegra, pode encontrá-lo no endereço:
http://www.educacaonline.pro.br/o_projeto_escola_viva.asp

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